Demorou para que chegássemos ao ponto de considerar as crianças como seres humanos providos de direitos. A evolução começou em meados do século 19, na França, com a ideia de que elas mereciam uma proteção especial, primeiramente no mundo do trabalho e, quatro décadas mais tarde, com leis sobre o direito à educação.
No século XX, também na França, a campanha de direitos para as crianças se estendeu para as áreas de saúde e vida social.
No pós-guerra, em 1947, a quantidade de crianças órfãs ou vivendo em penúria levou a uma conscientização maior em torno da questão da infância, e foi criado o fundo das Nações Unidas para a infância, o Unicef, com diversos programas de saúde, aleitamento materno, educação etc.
Outros marcos na conquista de direitos para a infância foram a Declaração dos Direitos da Criança, de 1959, e a Convenção dos Direitos da Criança, 30 anos depois. A partir daí, estabelecidos os direitos básicos de crianças e adolescentes, os avanços se tornaram mais específicos, com tratados, convenções e cartas sobre problemas como o trabalho infantil, tratamento de crianças com deficiência, pornografia, prostituição infantil e crianças em conflitos armados.

Informações que valem ser divulgadas
- Até a metade do século passado, a sociedade brasileira considerava que o cuidado com as crianças era um assunto doméstico, ou seja, apenas os pais ou cuidadores tinham responsabilidade. Nunca é demais frisar que esse entendimento mudou. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) divide as responsabilidades sobre a criança entre o Estado, a sociedade e a família. Da mesma forma como o ditado “em briga de marido e mulher não se mete a colher” representa uma visão defasada, que contribuía para a impunidade de agressões domésticas, também as situações de risco das crianças são um caso para a comunidade, a sociedade e o Estado.
- Isso ficou bem definido no Brasil com a aprovação da Lei Menino Bernardo, que ficou conhecida como a Lei da Palmada, em 2014. Em homenagem a um menino de 11 anos morto pelo pai e pela madrasta, a lei estabelece o direito de crianças e adolescentes de serem educados sem o recurso de castigos físicos ou tratamento cruel e degradante. Ela prevê advertência, cursos de orientação ou tratamento psicológico aos pais abusivos, e multa a médicos, professores e agentes públicos que saibam das agressões e não as denunciem. Em 2019, 56 países tinham legislação semelhante. Há, porém, uma ameaça de que o Brasil deixe este clube: corre na Câmara dos Deputados um projeto de lei para revogar a Lei da Palmada, sob o argumento de que ela representa uma intromissão do Estado em matérias reservadas à família. Se aprovado, o projeto, que inclui deveres para as crianças – como respeitar pais e responsáveis e participar das atividades em família e comunidade –, representará um retrocesso no direito das crianças.
- A primeira regulamentação para o trabalho de crianças ocorreu em 1891, e permitia que crianças trabalhassem a partir dos 12 anos de idade. A Constituição de 1934 elevou a proibição para os menores de 14 anos, mas em 1967 voltou a valer o limite de 12 anos. Finalmente, a Constituição de 1988 vedou qualquer tipo de trabalho a menores de 16 anos, a não ser na condição de aprendiz (nesse caso, a partir de 14 anos). Esta regra, porém, tem sido flexibilizada por decisões judiciais, especialmente quando a ocupação é indispensável à própria subsistência ou à dos pais, avós ou irmãos. Infelizmente, há no país 2,4 milhões de crianças e adolescentes que trabalham.119
- O ensino universal também tem sido uma conquista gradual. A Constituição de 1967 estabeleceu ensino gratuito e obrigatório para as crianças entre 7 e 14 anos. Em 2005, uma lei aumentou a faixa, exigindo que as crianças frequentassem a escola a partir dos 6 anos. Quatro anos depois, a Emenda Constitucional número 59 estendeu a obrigatoriedade do ensino até os 17 anos. Finalmente, em 2014, o Plano Nacional de Educação (PNE) estendeu a obrigação e a gratuidade para as crianças de 4 e 5 anos – obrigando o Estado a oferecer, até 2024, creches suficientes para atender, no mínimo, 50% das crianças até 3 anos de idade no país.
- Em 2019, o casamento infantil passou a ser definitivamente proibido. Antes da Lei 13.811, o Código Civil brasileiro permitia a união em qualquer idade em caso de gravidez ou para evitar pena criminal. Agora, ninguém pode casar com menos de 16 anos. Trata-se de uma medida urgente: a taxa de casamentos antes dos 18 anos, no Brasil, gira em torno de 20%.120 A meta, com base nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, é eliminar essa prática no país até 2030.121 De acordo com estudos do Banco Mundial 122, o casamento precoce está relacionado a maiores riscos para a saúde, menor escolaridade, renda mais baixa e maior fertilidade. As crianças geradas por essas meninas apresentam riscos maiores de mortalidade infantil e desnutrição, com possíveis consequências negativas para a vida adulta.

Informação sem complicação
- Lembre que a educação é uma das principais estratégias para combater as desigualdades e romper o ciclo intergeracional da pobreza, e que iniciar o ensino ainda na primeira infância é crucial para o desenvolvimento social, emotivo e intelectual do indivíduo. Sempre que puder, dê exemplos de socialização e ganho de autonomia pelas crianças que começam cedo na vida escolar.

- Sempre haverá exemplos de pessoas bem-sucedidas que trabalharam quando crianças. Mas elas são a exceção. Mostre, por meio de casos e pesquisas, como o estudo tem potencial de ajudar as crianças a vencer situações de pobreza.
- Ressalte os efeitos positivos das leis de proteção à infância. Um bom exemplo é que, desde a virada do milênio, com as campanhas pelos direitos das crianças, dois terços das gestantes passaram a fazer pelo menos sete consultas pré-natal, conforme o Programa de Humanização do Pré-Natal e Nascimento do Ministério da Saúde. Na década de 90, menos da metade das mulheres grávidas realizava todas as consultas.123
Ferramentas de comunicação e outras inspirações
- Você pode mostrar um gráfico de evolução de alguns direitos. Uma boa fonte é esta, nas páginas 61 a 63
- Fotos de meninas grávidas ou com filhos alertam para o risco do casamento infantil.
- Fotos de crianças trabalhando, enquanto outras se divertem ou estudam, também expõem claramente a desigualdade social e o potencial de perpetuação da pobreza.